4 de junho de 2021

BOMBAIM. (A desumanidade...)

"Ao amanhecer de um dia no fim de Julho, Sunil encontrou um apanhador de lixo caído na lama no cruzamento onde a rua de terra de Annawadi se encontrava com a grande estrada do aeroporto. Sunil conhecia mal o velho; ele trabalhava muito e dormia à porta do mercado de peixe de Marol, a cerca de 800 metros dali. A perna do homem estava esmagada e ensanguentada e ele pedia ajuda aos transeuntes. Sunil deduziu que ele fora atropelado por um carro. Alguns motoristas não se preocupavam muito em desviar-se dos apanhadores de lixo que esquadrinhavam as bermas das estradas.

Sunil teve demasiado medo de ir à esquadra da polícia pedir uma ambulância, especialmente depois do que se dizia que acontecera a Abdul. Em vez disso, correu para o campo de batalha dos contentores de lixo da Estrada da Carga, na esperança de que um adulto tivesse coragem de ir à esquadra. Milhares de pessoas passavam por ali todas as manhãs.

Duas horas depois, quando Rahul saiu de Annawadi para ir para a escola, o ferido pedia água.

(... ... )

Quando Zehrunisa passou por ali uma hora depois, o apanhador de lixo gritava com dores. Ela achou que a perna dele tinha um aspecto horrível, mas ia levar comida e medicamentos ao marido, que também estava com um aspecto horrível do outro lado da cidade, na prisão de Arthur Road.

(... ...)

Quando Rahul e o irmão voltaram da escola no princípio da tarde, o apanhador de lixo ferido estava deitado, quieto, a gemer baixinho. Às 14h30, um homem do Shiv Sena fez um telefonema para um amigo na esquadra da polícia de Sahar sobre um cadáver que estava a perturbar as crianças pequenas. Às 16 horas, os guardas chamaram outros apanhadores de lixo para carregarem o corpo para dentro de uma carrinha da polícia, par não apanharem as doenças que toda a gente sabia que os apanhadores de lixo tinham."


(sem dúvida, um dos livros mais inquietantes que já li.)

   

1 comentário:

  1. Tão iguais e tão diferentes somos neste globo minúsculo! Por mil razões.
    É um dos livros que fica: li; reli; um dia hei de ler de novo, pelo menos, para alimentar a ideia da gratidão que devo sentir por ter nascido tão afortunado.

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