8 de junho de 2021

MANUEL MATOS NUNES, POETA

 


Manuel Matos Nunes (MMN) revelou-se como poeta. De sua autoria vieram a lume os Cadernos do Verão (Abril , 2021), sob a chancela da  On y va. Os seus textos deixaram assim o mundo virtual da sua formação como objecto na imaginação do autor. De facto, constituem-se como  obra pela sua coerência e na medida em que poemas e referências se interligam e se tornam indispensáveis.  
Constituem-na 3 secções antecedidas de uma epígrafe que serve de linha de leitura e que é uma écfrasis nocional. A primeira é designada por Delírios Ecfrásticos e o poeta explora a linguagem ecfrástica em várias situações pois procede à representação verbal de uma representação visual. Usa com frequência a referencialidade genérica na medida em que são observadas outras características para além da representação pura, como, por exemplo a personalidade, Fui Narciso nos auto-retratos , pintor/de mineiros e camponeses(...), Van Gogh na noite estrelada sobre o Ródano (pg 37). Poema deslocada para outra secção por decisão do autor.

        Quanto à segunda secção Figurações do Incomum ela revela uma das causas da Poesia: a representação do incompreensível, do imaterial e do absurdo em todos os poemas e que são de certo modo uma das linhas de conduta do livro, e perante a admiração geral das instituições,/abandonou tudo, partindo não se sabe para onde/em demanda de um peixe fóssil, o coelacanto. (KZ,funcionário das Finanças) pg.27. 

Quanto à terceira secção que nomeia a obra o autor partilha uma série de emoções e experiências vividas em várias geografias e situações sendo de assinalar a oscilação da forma , de ritmos e cor que fazem deste um livro de imagens. Gostei particularmente de A agressiva razão do vazio, pela amargura: saber que já não se senta ninguém/no sofá da sala, onde os livros/se acomodam hoje. pg. 60. Livro de poesia promissor no qual MMN revela a sua Cultura que nos tem transmitido ao longo dos anos e a sua imensa febre de conhecimento em busca de perfeição.             

                        

5 comentários:

  1. Um belo livro. Aplaudo com as mãos ambas!

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  2. Obrigado, Laurindo, pela leitura e pelo belo texto. A imagem é surpreendente, o Pessoa escondido atrás do modesto livro!
    :)
    Abraço.

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    1. De nada Manuel, foi com muito gosto que o fiz. Contudo, o texto é uma gota de água no oceano. O teu livro merece e tem conteúdos para uma leitura mais atenta e cuidadosa. Se o R incluir o teu livro, o que espero, nos próximos anos aí podemos desenvolver as nossas ideias. Grande abraço, L.

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  3. Parabéns ao Manuel Nunes! Ser poeta é ser mais alto...

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  4. Irisalva

    Saiu de casa à hora do desassossego dos pássaros,
    quando abalavam para os campos as quadrilhas
    das mondas e os criados corriam as ruas desertas
    no serviço dos amos. Uma rosa de pano
    adornava-lhe, num fingimento álacre,
    a cinta do vestido. Levava a mala
    vazia de sonho e na pele uma saudade do amor.
    A manhã era uma sombra, um desafio,
    uma promessa ínvia: ela conhecia como ninguém
    o fragor da distância, o remorso lívido do corpo,
    o gume vivaz da vida por cumprir.
    Desapareceu, era já noite, num vórtice de árvores
    e searas murchas, o silêncio da planície
    cortado pelo grito rouco da automotora.

    (Manuel Matos Nunes, Cadernos de Verão, pg. 25)

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