14 de julho de 2024

POEMAS LIDOS E RELIDOS

 

Deixo aqui o poema de António Gedeão (1906-1997) lido na última sessão do clube: “Carta aberta”, desse livrinho cuja capa se apresenta na foto. Edição do autor, comprei-o em 67 ou 68 na Livraria Sá da Costa, de Lisboa. Ainda há restos da etiqueta da livraria e apresenta, escrito a lápis, o preço fabuloso de 25 escudos.

O poema – uma “arte poética”, isto é, conjunto de prescrições para o fazer poético – foi concebido em oitavas de verso livre com rima. A primeira oitava de esquema ABABCDCD e a segunda ABBACDDC. Sendo hoje domingo, não fica mal falar-se destas coisas... E, como parece recomendar um nosso colega nos seus comentários, sede felizes, felizes... com a poesia 😉

 

CARTA ABERTA

 

Um homem progride, blindado e hirsuto

como um porco-espinho.

É o poeta no seu reduto

abrindo caminho.

Abrindo caminho com passos serenos

e clava na mão,

que as noites são grandes e os dias pequenos

nesta criação.

 

Esmagando as boninas, os cravos e os lírios,

cortando as carótidas às aves canoras.

Chegaram as horas

de acender os círios,

de velar as ninfas no estreito caixão,

de enterrar as frases e as vozes incautas,

de oferecer a Lua para os astronautas

e as rosas fragantes à destilação.


4 comentários:

  1. O poema de cada dia nos dai hoje, dizia alguém.
    Precioso livro do grande Gedeão, agora com menor cotação no desinteressantíssimo no mercado dos poetisos, algo que ele nunca foi.

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