4 de setembro de 2018

REGRESSO ÀS... SESSÕES DA CURVA!


"- Aos meus sobrinhos? Àqueles ingratos? Nem um fio de cabelo meu lhes hei-de deixar. As minhas coisas vão todas para a igreja da minha freguesia. 
- Ribeira Filipe também? - indagou Felisberto, trémulo de emoção. 
Nha Noca não respondeu prontamente. Olhou demoradamente para Felisberto, assoou-se ao trapo roto e depois falou: 
- Até o dia de eu fazer o meu testamento, tenho muito que consultar este travesseiro - sorriu-se maternalmente para Felisberto, feito réu à espera da sentença. 
Despediu-se precipitadamente da parente idosa com um beijo na testa, desejando-lhe melhoras, melhoras, melhoras, correu à cozinha onde apalpou as nádegas à Guida sabinha, prosseguiu na correria até à escada de saída, que desceu como um «bidão» rolando na calçada do Bocarrão, aos trambolhões por aí abaixo. Quando se apanhou na rua, continuou com a mesma aceleração a caminho de casa, cantando em surdina esta modinha improvisada:

Ribêra Filipi é di mé, é di mé, é di mé mi só. "

Romance-saga, muito bem urdido, retrato fidelíssimo (pelo que conheço) da realidade cabo-verdiana no tempo colonial, em que o racismo, sempre latente, se apresenta, na maior parte das vezes, diluído numa especial forma de paternalismo apoiado na supremacia da raça branca sobre a negra e a mestiça e em que o envolvimento sexual é aceite desde que não frutifique numa "ninhada de netinhos de ventas largas e cabelo cuscuz" (pg. 302)



 


3 comentários:

  1. Ainda vou a menos de meio. Com altos e baixos, mas estou a gostar.

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  2. Ontem com a alegria de voltar ao Clube de Leitura e por não ter lido o livro todo,esqueci—me de realçar a importância de Caela. É preciso não esquecermos é vivermos com as flores, com bondade. Qual o sentido e o propósito da vida sem o que representa Caela? Podemos permitir que apodreça e se torne fétida? Podemos esquece —la?

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