22 de novembro de 2023

POESIA EM LÍNGUA PORTUGUESA, século XX (47)


O PORTUGAL FUTURO

 

O Portugal futuro é um país

aonde o puro pássaro é possível

e sobre o leito negro do asfalto da estrada

as profundas crianças desenharão a giz

esse peixe da infância que vem na enxurrada

e me parece que se chama sável

Mas desenhem elas o que desenharem

é essa a forma do meu país

e chamem elas o que lhe chamarem

Portugal será e lá serei feliz

Poderá ser pequeno como este

ter a oeste o mar e a Espanha a leste

tudo nele será novo desde os ramos à raiz

À sombra dos plátanos as crianças dançarão

e na avenida que houver à beira-mar

pode o tempo mudar será verão

Gostaria de ouvir as horas do relógio da matriz

mas isso era o passado e podia ser duro

edificar sobre ele o Portugal futuro

 

RUY BELO, Homem de Palavra(s)  (1970)


12 comentários:

  1. Respostas
    1. Fim, ao 47⁰? Ao menos, podias arrendondar...

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    2. Eu expliquei num comentário a razão do agudo número: é uma homenagem ao ano de 1947 que tão claros espíritos deitou ao mundo :) :) :)

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    3. Ah!Ah! Tenho ideia... Acho muito bem. Se calhar, vou-me unir à homenagem, filho que sou da mesma translação 🤪

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  2. A sua língua era a pátria portuguesa -- que tão mal o tratou, como é costume.
    Grande fecho! (Também tenho o meu Belo, sim senhor.) Haverá segunda série?

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  3. Parabéns Manuel. Terminaste a série da melhor forma. Esperemos que este país continue a ser possível sem monstruosidades e fantasmas.

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    1. Obrigado, Laurindo, pelo comentário. Monstruosidades, pois... Se me pusesse a falar...

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  4. «... o homem sonha... a obra nasce»... às vezes. J. A. Marcos Serra

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  5. Homem de Palavra(s) é apontado como sendo de 1969, embora o meu livrinho - exemplar do nº 9 dos Cadernos de Poesia das Publicações Dom Quixote - refira em "colofão" ter sido composto e impresso em Janeiro de 1970. Neste ano o comprei. O que queria dizer com isto é que é daqueles anos a visão de Ruy Belo sobre o Portugal futuro. Repare-se que é já um Portugal descolonizado: pequeno e com o mar a oeste e a Espanha a leste. Quem disse que os poetas não vêem as coisas antes de elas acontecerem?

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