NAMBUANGONGO MEU AMOR
Em Nambuangongo tu não viste nada
não viste nada nesse dia longo longo
a cabeça cortada
e a flor bombardeada
não tu não viste nada em Nambuangongo.
Falavas de Hiroxima tu que nunca viste
em cada homem um morto que não morre.
Sim nós sabemos Hiroxima é triste
mas ouve em Nambuangongo existe
em cada homem um rio que não corre.
Em Nambuangongo o tempo cabe num minuto
em Nambuangongo a gente lembra a gente
esquece
em Nambuangongo olhei a morte e fiquei
nu. Tu
não sabes mas eu digo-te: dói muito.
Em Nambuangongo há gente que apodrece.
Em Nambuangongo a gente pensa que não
volta
cada carta é um adeus em cada carta se
morre
cada carta é um silêncio e uma revolta.
Em Lisboa na mesma isto é a vida corre.
E em Nambuangongo a gente pensa que não
volta.
É justo que me fales de Hiroxima.
Porém tu nada sabes deste tempo longo
longo
tempo exactamente em cima
do nosso tempo. Ai tempo onde a palavra
vida rima
com a palavra morte em Nambuangongo.
MANUEL ALEGRE, Praça da Canção (1965)
Para a História.
ResponderEliminarIsto não é um poema
ResponderEliminarTU nunca
Estiveste
Numa guerra
Como eu estive
TU nunca
Sentiste
Nada
Como eu senti
TU nunca
Perdeste
Tudo
Como eu perdi
TU nunca
Viste
A morte
Como eu vi
TU nunca
Moraste
Na vida
Como eu morei
TU és apenas
Um mero
TU
Tu e todos os tus
Que nunca serão
Eu
Que nunca serão
Nós
E jamais me conseguirão
Ferir...
Politicamente falando.
ResponderEliminarNão sendo um incondicional de MA, nem como poeta nem como prosador, gosto bastante deste poema, e de uns tantos mais, com uma sonoridade que associo à voz do autor.
ResponderEliminarEu ouvia-o falar de Argel na Rádio Voz da Liberdade. Essa voz! Quanto ao poema, acho que é um grande poema do nosso século XX. Não só pela poesia, mas por tudo.
EliminarExcelente. É dos que gostaria de ter sido eu a escrever.
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