Ao entardecer, debruçado pela janela,
E sabendo de soslaio que há campos em
frente.
Leio até me arderem os olhos
O livro de Cesário Verde.
Que pena que tenho dele! Ele era um
camponês
Que andava preso em liberdade pela
cidade.
Mas o modo como olhava para as casas,
E o modo como reparava nas ruas,
E a maneira como dava pelas coisas,
É o de quem olha para árvores,
E de quem desce os olhos pela estrada por
onde vai andando
E anda a reparar nas flores que há pelos
campos…
Por isso ele tinha aquela grande
tristeza
Que ele nunca disse bem que tinha,
Mas andava na cidade como quem anda no
campo
E triste como esmagar flores em livros
E pôr plantas em jarros…
ALBERTO CAEIRO, poema III de “O
Guardador de Rebanhos”, 1911-1912
Que bem que ele apanha a tristeza do Cesário -- que parece ser uma tristeza já nossa quando o lemos, porque lhe conhecemos o destino.
ResponderEliminarSim o Ricardo disse tudo...."uma tristeza já nossa" ...quando encontramos as portas fechadas da nossa aldeia e os sinos tocam com uma enorme surdez por dentro do silêncio dos objectos que nos fazem perguntas impossíveis.
ResponderEliminarEste poema, que não conhecia, foi como uma pílula de melancolia, para mim. Mas uma melancolia doce, que faz humedecer os olhos de encanto... perante Cesário, perante Alberto Caeiro, e perante os campos...
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