Um rumor de árvores num obscuro frescor
que trespassa o jardim e o patamar deserto
o bafo de uma lâmpada nocturnamente azul
um eco de cavalos uma sombra materna
um crepúsculo de água uma flauta cintilante
uma alameda húmida em vegetal sossego
um odor de segredo que amanhece no vidro
gotas de sombra pesadas sinuosas
o tecido de chuva ondulando nos telhados
a música das cadeiras em círculo no terraço
e as escadas que delicadas sobem no vazio
ANTÓNIO RAMOS ROSA, As armas imprecisas, 1992
Muito bom este algarvio! Lembro-me sempre dos poemas "O boi da paciência" e "O funcionário cansado". Nos meus 47, publiquei-lhe «Amor da palavra, amor da voz», dedicado a Maria Aliete Galhoz. Desde os tempos do Gharb-al-Andaluz que o Algarve tem grandes poetas. O maior é talvez Álvaro de Campos, natural de Tavira, segundo diz Fernando Pessoa. Já procurei, mas não encontrei certidão de nascimento que o ateste. Ele há coisas...
ResponderEliminarTALVEZ um convívio próximo com uma tia espírita possa ter originado essas multiplicidades.
EliminarTem dias em que gosto muito do Ramos Rosa, e hoje é um deles.
ResponderEliminarAh, Ramos Rosa ❤️ No próximo ano comemora-se o centenário do seu nascimento. 17 de Outubro de 1924. Andei a pesquisar mas ainda nada encontrei de possíveis eventos ou actividades. Talvez seja cedo.
ResponderEliminarE com este poema lembrei-me de "Árvores". Partilho aqui 😊
"O que tentam dizer as árvores
no seu silêncio lento e nos seus vagos rumores,
o sentido que têm no lugar onde estão,
a reverência, a ressonância, a transparência
e os acentos claros e sombrios de uma frase aérea.
E as sombras e as folhas são a inocência de uma ideia
que entre a água e o espaço se tornou uma leve integridade.
Sob o mágico sopro da luz são barcos transparentes.
Não sei se é o ar se é o sangue que brota dos seus ramos.
Ouço a espuma finíssima das suas gargantas verdes.
Não estou, nunca estarei longe desta água pura
e destas lâmpadas antigas de obscuras ilhas.
Que pura serenidade da memória, que horizontes
em torno do poço silencioso! É um canto num sono
e o vento e a luz são o hálito de uma criança
que sobre um ramo de árvore abraça o mundo."
e o vento e a luz são o hálito de uma criança
que sobre um ramo de árvore abraça o mundo ❤️
António Ramos Rosa em "Obra Poética I"
Assírio & Alvim
1ª edição, Setembro de 2018
Página 1176