AS PALAVRAS
São como um cristal,
as palavras.
Algumas, um punhal,
um incêndio.
Outras,
orvalho apenas.
Secretas vêm, cheias de memória.
Inseguras navegam:
barcos ou beijos,
as águas estremecem.
Desamparadas, inocentes,
leves.
Tecidas são de luz
e são a noite.
E mesmo pálidas
verdes paraísos lembram ainda.
Quem as escuta? Quem
as recolhe, assim,
cruéis, desfeitas,
nas suas conchas puras?
EUGÉNIO DE ANDRADE, Coração do Dia (1958)
Tenho um poema de arromba do Eugénio de Andrade. Não é um dos meus poetas (prefiro-lhe a prosa), mas acabou por estar facilmente nos 101,
ResponderEliminarPara mim, este é um daqueles poetas que só escrevem poemas bons!
ResponderEliminarJá sabemos é um dos nossos grandes poetas. Quando o leio, e, faço-o raramente, por vezes, os seus poemas de tão transparentes, tornam-se num problema...já não acontece com o Ramos Rosa que é problemático por natureza e ao lê-lo tudo se reduz a luz ..Foram as duas grandes referências da minha geração. Acho este poema um pouco longo. O poeta com metade dos versos e cuidando da prosa e dos ritmos tirava um poema muito melhor...acho-o excessivo.
ResponderEliminar"As palavras", poema segundo de "Coração do Dia" é - como diz Fernando J. B. Martinho em prefácio de edição recente - «um dos mais citados de Eugénio de Andrade [não escapei à tendência], visto habitualmente não como uma imagem perfeita da sua poética, mas de um mais ampla arte poética moderna, que valoriza a diversidade e a contradição inerentes à matéria (mutável e viva) com que se fazem os poemas, a linguagem». Toda a poesia é excessiva, naquele sentido de dizer o mundo de maneira que nenhum outro discurso o diz, com recurso a meios (chamemos-lhe assim por simplificação) estranhos ao rigor dos discursos científico, jurídico, etc. Por isso é que Ruy Belo dizia ser a poesia uma doença da linguagem. É o que me parece, mas que sei eu?
EliminarEstudei Eugénio de Andrade no liceu. "As Mãos e os Frutos". Gosto muito Mas já há algum tempo que à sua poesia-música não regresso.
ResponderEliminarPrefiro a primeira estrofe. J. A. Marcos Serra
ResponderEliminar