8 de fevereiro de 2021

SAADI, antítese de MAQUIAVEL

 Depois de O Príncipe, de Maquiavel, que livro me vem parar defronte? Fábulas Orientais, do poeta e prosador persa, distinguido pela qualidade de escrita, suporte de uma profundidade de pensamento social e moral, Saadi de Xiraz (1210 - 1292) (?).

De Maquiavel sabemos todos um pouco, e, agora que acabámos de ler a sua obra mais famosa, é aconselhável tomarmos cuidado para não nos tornarmos admiradores de «heróis» que seguiram os seus ditames, entre os quais se colocou em bicos de pés, Napoleão Bonaparte, ao comentar, com sobranceria, quem era suposto ser  o mestre.

A equilibrar o pensamento, surge então Saadi (emparceirando com Rumi e Hafez no céu da literatura persa), de quem deixo dois excertos: «Quando todos os seres humanos são úteis uns aos outros, que homem se atreverá a existir inútil para a sua pátria e para o Mundo?». «Toda esta gente vai a casa do meu amigo em razão do seu cargo importante; eu porém hei de ir lá, quando ele deixar de o ter, e estou bem certo que então me hei de achar sozinho [com ele]».

E, realçando a antítese, cito o tradutor da versão portuguesa das Fábulas Orientais: «Pelo que, na lição bem modesta destas Fábulas, poderá encontrar o Príncipe altíssimas máximas na arte de governar, o Ministro de Estado excelentes exemplos propostos a sua imitação, e todo o homem em geral doutrinas de moral pura que, postas por ele em prática, aumentarão a sua sensibilidade e melhorarão indubitavelmente o seu coração». (Francisco Freire de Carvalho, que foi Professor de História e de Antiguidades na Universidade de Coimbra).


Finalmente: um dos exemplos que Maquiavel invoca recorrentemente, César Borgia, filho do celebérrimo papa Alexandre VI, acabou sepultado à porta de uma igreja, em Viana (Logronho), «para ser pisado pelo povo». O mausoléu elevado ao bom conselheiro que foi Saadi, mantém-se como símbolo de homenagem à grandeza interior do homem, em contraste com o poder terreno, sempre transitório.

2 comentários:

  1. Bem apanhado, meu caro, não obstante "O Príncipe" ser um tratado de política e uma exortação à unidade italiana, quando a península era invadida pelos "bárbaros" (franceses, alemães, espanhóis). Mas uma boa evocação no dia 8 de Fevereiro de 20121, quando se cumprem cem anos sobre a morte de Piotr Kropótkin, um doutrinador da cooperação mútua, que tanta influência exerceu sobre Ferreira de Castro, e cuja citação que fez de Saadi me fez lembrar.

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  2. Kropótkin não influenciou apenas Ferreira de Castro; li-o, bem como Malatesta, Bakunine e outros, por volta de 1974 - 75, em exemplares que tinham andado clandestinos, emprestados por um colega de trabalho, velho anarco-sindicalista que, por simples acaso, tinha sido carimbado, na altura, «napoleonico-maquiavelicamente... e fiquemos por aqui», de fascista.

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