«O meu nome é Aurora Rodrigues», Aurora Rodrigues, Gente Comum -- Uma História na Pide, 2.ª ed., introduções de Paula Godinho e António Monteiro Cardoso, Lisboa, Parsifal , 2022.
Gente Comum é um relato sincero, uma confissão quase silenciosa, de uma vivência de luta persistente, tenaz, contra o regime de Salazar. A nota prévia e a Introdução são fundamentais para a introdução no contexto da obra. Está bem escrito, com os capítulos e subcapítulos bem estruturados e organizados e revelam o cuidado meticuloso de Aurora Rodrigues em relatar a verdade o melhor que a memória lhe podia devolver. Denota-se uma honestidade intelectual alicerçada. A sua capacidade de resistência é sobre-humana. Esta obra foi uma surpresa visto não ter vivido os primeiros anos do pós-25 de Abril em Portugal Continental. O facto de Aurora ter sido presa e torturada antes do 25 de Abril e após, deixou-me estupefacto. Destaco uma passagem, (pág. 132) que me tocou fundo: "Quer dizer, eram todos torcionários, mas havia uns que assumiam, que sentiam menos relutância. Não sei se algum sentia relutância, não sei explicar isso, não sei definir essa pessoa. Tenho muita dificuldade em achar que são humanos, que são normais, ou se não tinham uma tara qualquer. Como e que alguém normal, se sujeita a dar este tipo de tratos de forma sistemática durante horas, dias, meses a um pessoa que não conhece de lado nenhum, que tem pouco mais de 20 anos - ou se tivesse mais -, uma pessoa que não lhes fez nada e eles não conhecem ?" Parei neste trecho e revi o que assisti em Dachau, no campo de concentração nazi, as atrocidades que vi num livro francês, sobre a guerra colonial, que mais adiante relato o episódio, o alastramento da maldade no mundo, desde os primórdios. Em toda a extensão do Universo, só existe um lugar minúsculo onde está alojada a maldade. É dentro de nós. E de que matéria é feito um torcionário ? Sempre foi uma das minhas questões existenciais.
Sessão de excelência, diferente de todas, com uma falha quase dolorosa: necessitaria de ter durado mais seis ou sete horas. Não é apenas um livro: é História que convivemos, cada um à sua maneira, que teve a capacidade de nos mergulhar nas vivências que o tempo, afinal, não apagou
Gente Comum é um relato sincero, uma confissão quase silenciosa, de uma vivência de luta persistente, tenaz, contra o regime de Salazar. A nota prévia e a Introdução são fundamentais para a introdução no contexto da obra. Está bem escrito, com os capítulos e subcapítulos bem estruturados e organizados e revelam o cuidado meticuloso de Aurora Rodrigues em relatar a verdade o melhor que a memória lhe podia devolver. Denota-se uma honestidade intelectual alicerçada. A sua capacidade de resistência é sobre-humana. Esta obra foi uma surpresa visto não ter vivido os primeiros anos do pós-25 de Abril em Portugal Continental. O facto de Aurora ter sido presa e torturada antes do 25 de Abril e após, deixou-me estupefacto.
ResponderEliminarDestaco uma passagem, (pág. 132) que me tocou fundo:
"Quer dizer, eram todos torcionários, mas havia uns que assumiam, que sentiam menos relutância. Não sei se algum sentia relutância, não sei explicar isso, não sei definir essa pessoa. Tenho muita dificuldade em achar que são humanos, que são normais, ou se não tinham uma tara qualquer. Como e que alguém normal, se sujeita a dar este tipo de tratos de forma sistemática durante horas, dias, meses a um pessoa que não conhece de lado nenhum, que tem pouco mais de 20 anos - ou se tivesse mais -, uma pessoa que não lhes fez nada e eles não conhecem ?"
Parei neste trecho e revi o que assisti em Dachau, no campo de concentração nazi, as atrocidades que vi num livro francês, sobre a guerra colonial, que mais adiante relato o episódio, o alastramento da maldade no mundo, desde os primórdios. Em toda a extensão do Universo, só existe um lugar minúsculo onde está alojada a maldade. É dentro de nós.
E de que matéria é feito um torcionário ? Sempre foi uma das minhas questões existenciais.
Sessão de excelência, diferente de todas, com uma falha quase dolorosa: necessitaria de ter durado mais seis ou sete horas.
ResponderEliminarNão é apenas um livro: é História que convivemos, cada um à sua maneira, que teve a capacidade de nos mergulhar nas vivências que o tempo, afinal, não apagou