A personagem arquetípica, a "personagem-multidão", como Castro caracterizou o seu Manuel da Bouça, o romance de intenções revolucionárias, a luta de classes -- tudo o que viria a designar-se por neo-realismo, exceptuando o vínculo ao PCP, porque o anarquismo inspirado em Kropótkin era pouco compatível com o autoritarismo de Marx e de Lénin -- está neste romance, e vigorou hegemonicamente durante vinte anos, até à Aparição, de Vergílio Ferreira, de 1949, ano em que Ferreira de Castro, após A Lã e a Neve (1947), aparenta mudar, escrevendo A Curva da Estrada, publicado no ano seguinte:
«[...] Nasce o homem e, se não dispõe de riqueza acumulada pelos seus maiores, fica a mais no Mundo. Entra na vida -- já se disse e é bem certo -- para a luta! Luta para criar o seu lugar, luta contra os outros homens, luta pelas coisas mesquinhas e não pelas verdadeiramente nobres, por aquelas que contribuiriam para uma maior elevação humana. Para essas quase não há tempo de existência de cada um.
/ [...] /
Biógrafos que somos das personagens que não têm lugar no Mundo, imprimimos neste livro despretensiosa história de homens que, sujeitos a todas as vicissitudes provenientes da sua própria condição, transitam de uma banda a outra dos oceanos, na mira de poderem também, um dia, saborear aqueles frutos de oiro que outros homens, muitas vezes sem esforço de maior, colhem às mãos cheias.»
Ferreira de Castro, do «Pórtico» de Emigrantes, 28.ª edição, Lisboa, Guimarães Editores, 1988.
Só uma correcção: "Aparição" foi publicada em 1959 e não em 1949.
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