LEITURAS DAS QUARTAS-FEIRAS...
«Lhe entrego dinheiro, prometo, tenho muito dinheiro fora. Não duvide: são cifras, maquias e quantidades. Tenho e tenho. E dou-lhe tudo, totalmente. Mas me traga chuva, uma porção de chuva boa, grossa e gorda. Estou doido? Por causa de querer que chova aqui, dentro da prisão? Pode ser, pode ser loucura. Mas a loucura é a única que gosta de mim. O senhor que é um inventador de realidades, me faça esse favor. Me invente, rápido, uma urgente chuvinha.
Antigamente, valia a pena ser preso. O cantinho da prisão nem era mau, comparado com o mundo que nos cabia, lá fora. Falo sério. Maioria do que aprendi foi na prisão. Ler, escrever: foi na prisão que me letrinhei. Minha vida era uma roda-ronda entre roubo e grades. Me prendiam: era um consolo cheio de sossego. Lá fora ficava o mundo, mais suas doenças, suas nauseabundâncias.»
(Do conto "A última chuva do prisioneiro")
Delicioso :)
ResponderEliminarMia Couto é merecedor de um lugar bem destacado na literatura lusófona.
EliminarÉ um grande inventor de histórias e um grande artista das palavras!