26 de fevereiro de 2018

"Quem"?

«Quem há aí que seja a sós o mesmo que é cá fora e quem foi que em certas horas não representou até consigo mesmo?» Raul Brandão, A Morte do Palhaço e o Mistério da Árvore [1926], Lisboa, Editorial Verbo, 1972, p. 12.

16 de fevereiro de 2018

É COM ALEGRIA

que sossego os caros confrades, informando que o meu exemplar de DONDE VIEMOS já apareceu.
Estando eu, há dias, e pela enésima vez, a percorrer atentamente (?) com o olhar as lombadas da estante onde pensava que ele podia acoitar-se, eis que ouço uma voz escarninha, vinda da prateleira do meio, mesmo à frente dos meus olhos: "Estou aqui, ó seu zarolho!"
Perdoando-lhe a irreverência, peguei nele e segredei-lhe ao ouvido: «Tens toda a razão; estou a ficar velho e cegueta». 
Depois, comecei a devorá-lo...  
Chegado à página 71, deparei com este poema escrito a duas mãos por Marcial e A. Borges Coelho:

«No fundo do vale mugem os touros bravios», e pelo «campo selvoso», a farta Ceres mostra os cereais e os frutos, as «ânforas exalam o odor dos produtos outonais». E vagueia toda uma turba de vitelos, cordeiros, porcos que «seguem o avental da caseira», gansos, pavões, pombos, galinhas de Rodes, faisões de Colcos, galinhas pedreses da Numídia. A tez cor de leite dos escravos da casa denuncia a origem do Norte europeu. O podador transporta as uvas tardias, o pedagogo e o quinteiro exercitam os jovens brincalhões, o dispenseiro e até o «efeminado eunuco» se comprazem no trabalho. Os camponeses da vizinhança, por certo dependentes, vêm saudar o patrão, trazendo mel e queijo.

Boa leitura e 

ATÉ DIA 2!



o vírus da inveja

«Contagioso, propagou-se pela Terra; congênito, atacou desde o início. Como se sabe, o primeiro ser humano fecundado pelo sêmen de um homem numa mulher, o que experimentou a relação primal de prazer e frustração, o que mamou no seio materno, esse já nasceu com o sangue contaminado pelo vírus da inveja.» Zuenir Ventura, Inveja -- Mal Secreto [1998], Lisboa, Planeta, 2010, p. 105.

14 de fevereiro de 2018

o início de A TEMPESTADE

«Contra o seu costume, Albano viera tarde e entrara sem os cuidados tidos nas outras noites, quando queria abafar rumores; logo, porém, volvera às precauções de sempre.» (16.ª ed., Lisboa, Cavalo de Ferro, 2017)

11 de fevereiro de 2018

DONDE VIEMOS...


Se alguém encontrar um exemplar novinho em folha, sem saber DONDE VEIO, tome atenção, que pode ser meu... Na verdade, comprei um há dias na Bertrand, cheirei-o (como é habitual), abri-o ao acaso e dei uma espreitadela ao texto (como também é costume), logo ficando com o apetite desperto. Depois (como mais uma vez é usual), devo tê-lo atirado para o banco de trás, ao chegar ao carro... Aqui começa a parte enigmática: infelizmente, no dia seguinte tinha-lhe perdido o rasto... Larguei-o algures... Não sei PARA ONDE FOI... 
Acalento a esperança de que, arrependido da aventura, volte ao redil a tempo de o ler para a próxima sessão... E, como sou tolerante e compreensivo, não lhe vou perguntar POR ONDE ANDOU... 
(Era para acrescentar aquele bonequinho com a piscadela de olho, mas não o encontrei... Por favor, façam de conta que o vêem... Outro bonequinho...)


7 de fevereiro de 2018

uma epígrafe de José Cardoso Pires

«Tudo vai de saber guardar a confiança. De não esmorecer.» (O Hóspede de Job)
in Praça de Canção (1965) de Manuel Alegre.

3 de fevereiro de 2018

UM APONTAMENTO AUTOBIOGRÁFICO EM "A TEMPESTADE"

«Volveu ao passado, à aldeia nativa. Surgiam os campos à beira do rio, a velha ponte, a levada, a igreja lá ao fundo. Em seguida, o grupo de austeros castanheiros que existia na estrema do vale, já nas faldas da serra. “Havia muito sol nos castanheiros quando ele dissera a Mariana que estava apaixonado por ela – e ela começara a rir-se… Tinha razão. Ela era já uma rapariga de vinte anos e ele um garoto. Fora o seu primeiro interesse feminino.”»
--- Capítulo II, Albano recordando a sua vida no transe doloroso do dia 10 de Maio.

«Um amor pueril iria dar novo rumo à sua vida. Apaixonara-se por Margarida, que aos dezoito anos pouco ligava à criança que ele, com pouco mais de dez, ainda era. Um acto temerário agigantá-lo-ia, decerto, aos olhos de Margarida. Decidiu, a exemplo do que faziam muitos homens e rapazes da sua idade, emigrar para o Brasil, proeza que espantaria tudo e todos.»
--- Dados biográficos da infância de Ferreira de Castro, Guia da Exposição do Museu Ferreira de Castro, Sintra.

Foto: exemplar de "A Tempestade" adquirido em alfarrabista, edição de 1940, carimbada na última página com o ex-líbris do autor.


1 de fevereiro de 2018

Nathan, o Pessimista

«[...] Receio bem que metido entre os homens desaprendas o que é ser homem.» Gottold Ephraim Lessing, Nathan o Sábio, trad. Yvette Centeno, Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, 2016, p. 59.