AOS VINDOUROS, SE OS HOUVER...
Vós que trabalhais só duas horas
a ver trabalhar a cibernética,
que não deixais o átomo a desoras
na gandaia, pois tendes uma ética;
que do amor sabeis o ponto e a vírgula
e vos engalfinhais livres de medo,
sem preçarios, calendários, Pílula,
jaculatórias fora, tarde ou cedo;
computai, computai a nossa falha
sem perfurar demais vossa memória,
que nós fomos pràqui uma gentalha
a fazer passamanes com a história;
que nós fomos (fatal necessidade!)
quadrúmanos da vossa humanidade.
ALEXANDRE O' NEILL, De Ombro na Ombreira (1969)
Nota: O' Neill, uma poesia que vai do satírico ao elegíaco (lembremo-nos de "Seis poemas confiados à memória de Nora Mitrani", Poemas com Endereço, 1962), aqui com uma saborosa antevisão de tempos marcados pelo imaginário do nuclear, da computação, do amor livre e da sociedade do lazer. Mais de meio século depois, que dizer das palavras do poeta?
O perfurar do computai indica a vetustez relativa do poema, creio.
ResponderEliminarA nota que fizeste é uma excelente linha de leitura para este soneto. São por estas e por outras que os Cadernos foram tão importantes despertando-nos para as voltas de uma nova linguagem.continua.
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