CANTIGA PARA OS TRABALHADORES DOS CAMPOS
Sou cavador, cavo a terra
Donde nasce a flor e o grão.
Dou aos outros a fartura
E em casa não tenho pão.
Hoje planto árvor's e vinha,
Lavro a terra, rego a horta,
E amanhã, em sendo velho,
Pedirei de porta em porta.
O sol a todos aquece,
Não nega a luz a ninguém,
Ama os bons e ama os maus
E assim foi Jesus também.
A árvore, quanto mais fruto,
Mais baixa os ramos p'ra o chão.
O homem, quanto mais rico,
Mais ergue a sua ambição.
A vida do pobre é isto:
-- Trabalhar enquanto moço,
E em velho andar às esmolas
Como o cão que busca um osso.
Morre um rico, dobram sinos!
Morre um pobre, não há dobres!
Que Deus é esse dos padres
Que não faz caso dos pobres?
Se pão não tenho, e os meus filhos
Me pedem pão a chorar,
Dou-lhes beijos, coitadinhos!
Que mais não lhes posso dar...
Sinto no mundo um rumor
Que anuncia um dia novo,
Andam profetas na terra
Abrindo os braços ao povo!
O sol nasceu cor de sangue
E a lua da mesma cor.
Gritam as bocas: Mais pão!
E os corações: Mais amor!
Bernardo de Passos, (São Brás de Alportel, 1876-1930)
Refúgio (póst., 1938) / Líricas Portuguesas. 2.ª Série
(edição de Cabral do Nascimento)
Singelo mas acutilante...
ResponderEliminarLá fui bater à porta da Wikipédia, que, solicitamente me informou tratar-se de um
... poeta de forte pendor lírico, pessoa de temperamento simples e modesto; vida curta...
(Vê-se quase tudo no poema...)
A grandeza da simplicidade.
EliminarO facto de discordar do conteúdo de uma quadra, não retira a beleza à singeleza e ao sentimento que se vê brotar.
ResponderEliminarNunca tinha ouvido falar do autor.
É um poeta desperto para o meio envolvente e para as pessoas que o habitam, talvez herdeiro de João de Deus.
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