TRABALHAR CANSA
Atravessar uma rua para fugir de casa
só um rapaz é que o faz, mas este homem que vagueia
todo o dia pelas ruas já não é um rapaz
e não está a fugir de casa.
Há tardes
no verão em que até as praças ficam vazias, estendidas
sob o sol que está prestes a pôr-se, e este homem, vindo
por uma alameda de inúteis plantas, pára.
Vale a pena estar sozinho, para se estar cada vez mais sozinho?
Vaguear por elas apenas, as praças e as ruas
estão vazias. É preciso travar uma mulher
e falar com ela e convencê-la a viver a dois.
Ou então fica-se a falar sozinho. Daí que por vezes
haja o bêbedo nocturno que mete conversa,
e conta os projectos de uma vida inteira.
Não é certamente aguardando na praça deserta
que se encontra alguém, mas quem vagueia pelas ruas
detém-se por vezes. Se fossem dois,
mesmo a andar pela rua, a casa seria
onde está aquela mulher, e valeria a pena.
Volta a praça a ficar deserta à noite,
e este homem, que passa, não vê as casas
entre as luzes inúteis, já não ergue os olhos:
sente apenas a calçada, que outros homens fizeram
com mão endurecidas, como são as suas.
Não é justo ficar na praça deserta.
Andará com certeza pela rua a mulher
que, rogada, daria com gosto um jeito na casa.
Cesare Pavese (Santo Stefano Belbo, Piemonte, 1908 - Turim, 1950),
Trabalhar Cansa (1936)
Versão de Vasco Gato, Lisboa, 1978)
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