O MEU TIO DE NANTES
"Nós íamos a pé para os aterros do rio e demorávamos mais de uma hora a chegar lá, troc, troc, por aquelas veredas abaixo e ele no seu cestinho de vime à cabeça da tia Teresa que já teria para aí uns dezoito ou dezanove anos (... ...) Depois pousava-o numa sombra, ou embrulhadinho em cobertores, no pino do inverno, e quando ele chorava muito ela dizia-me assim: «Ó Gilda toma lá conta dele que tu és ainda muito pequenina para andares aqui com as perninhas dentro desta água tão fria o dia inteiro.» E às vezes era eu que ficava com ele ao colo. Eu acho que ele chorava de fome, coitadinho, e eu abanava-o, abanava-o até a tia Teresa ter outra vez um bocadinho de leite para ele mamar porque ela tinha muito pouco leite. Ó filho, quando hoje me lembro disto tudo até me parece que aquilo não pode ter acontecido: irmos três garotas, no pino do frio e do calor, para o Cabeço do Pião com uma merendita para o dia inteiro e a tia Teresa com aquela cestinha de vime à cabeça, com o Floriano lá dentro, que veio a casar com uma Palmira de Moncorvo e eram primos da Fernanda do Lúcio que trabalhava na Câmara do Barreiro e que o marido a deixou. E passávamos o dia inteiro a arear, a arear dentro do rio... e aquele menino à cabeça para trás e para diante.
Ai filho(...)"
(Pg. 79-80)
Este belíssimo livro, que se lê com gula e deleite, é assinado por Carlos Daniel. Contudo, podemos afirmar que a verdadeira autora é a Senhora sua Mãe, Dona Gilda, que em grande parte lho 'ditou', através de longos telefonemas ou em conversas dispersas ao longo da vida. A Carlos Daniel coube a meritória tarefa de, com talento e arte, converter os monólogos telefónicos e os pitorescos relatos da anciã em belíssimas peças de prosa.
Um abraço de parabéns, Carlos Daniel. Antevejo uma sessão animada e enriquecedora, na qual, com muita pena minha, não poderei estar presente.
F. Faria
Obrigado pela apreciação inaugural da obra neste blogue. Reservo-me para a sessão que, concordo, deverá ser animada e enriquecedora.
ResponderEliminarAté amanhã para quem se puder apresentar.
Tive de faltar à sessão, com pena minha.
ResponderEliminarUma coisa foi ter enviado uma análise do trabalho ao autor; outra é poder participar e dialogar, interpretando e esclarecendo.
A ver se na próxima sessão tenho oportunidade de, pedindo o autógrafo ao Carlos Daniel, lhe mostrar o meu apreço pela originalidade e pela forma.