28 de outubro de 2023

101 poemas portugueses - #4

 TROVA À MANEIRA ANTIGA

Comigo me desavim,
Sou posto em todo o perigo;
Não posso viver comigo
Nem posso fugir de mim.


Com dor, da gente fugia,
Antes que esta assim crescesse;
Agora já fugiria
De mim, se de mim pudesse.
Que meio espero ou que fim
Do vão trabalho que sigo,
Pois que trago a mim comigo,
Tamanho imigo de mim?

Sá de Miranda (Coimbra, 1481 - Amares, 1558)
in José Régio, Poesia de Ontem e de Hoje para o Nosso Povo Ler (1956)

7 comentários:

  1. Sá de Miranda, grande personalidade! Retirado para a "aurea mediocritas" quatro séculos antes de Herculano. Também gosto muito destas trovas à maneira antiga:
    AO AMOR E À FORTUNA
    Amor e Fortuna são
    dous deuses que os antigos
    ambos os pintaram cegos;
    ambos não seguem rezão;
    ambos aos mores amigos
    dão mores desassossegos;
    ambos são sem piedade;
    ambos não lhes tomais tino
    do querer ou não querer;
    ambos não falam verdade:
    Amor é cego minino,
    Fortuna é cega mulher.

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  2. Respostas
    1. É extraordinária a forma como ele nos dá o conflito interior. E sabendo-se da retirada da corte, ainda mais.

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  3. https://youtu.be/tO4dxvguQDk?feature=shared

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  4. Tenho em grande conta o pensamento subjacente.
    Mas como se afirma que há remédio para tudo, menos para a «da gadanha», do mesmo modo que se foge da corte, pode-se fugir de cá: é questão de nível de coragem e vontade.
    Aprecio o autor.

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