29 de outubro de 2023

POESIA EM LÍNGUA PORTUGUESA, século XX (22)

 

BILHETE PARA O AMIGO AUSENTE

 

Lembrar teus carinhos induz

a ter existido um pomar

intangíveis laranjas de luz

laranjas que apetece roubar.

 

Teu luar de ontem na cintura

é ainda o vestido que trago

seda imaterial seda pura

de criança afogada no lago.

 

Os motores que entre nós aceleram

os vazios comboios do sonho

das mulheres que estão à espera

são o único luto que ponho.

 

NATÁLIA CORREIA, O Vinho e a Lira (1966)


6 comentários:

  1. Não consigo gostar da poesia dela, com uma ou outra excepção.

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    1. Grande figura, a Natália! A mesa censória tinha-lhe um ódio profundo. Os poemas de "O Vinho e a Lira" não escaparam e só por isso merece estar aqui um deles.
      Não gosta de A DEFESA DO POETA?, aquele que começa assim,

      «Senhores juízes sou um poeta
      «um multipétalo uivo um defeito
      «e ando com uma camisa de vento
      «ao contrário do esqueleto.»

      e acaba

      «Sou uma impudência a mesa posta
      «de um verso onde o possa escrever.
      «Ó subalimentados do sonho!
      «a poesia é para comer.»

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    2. https://youtu.be/GsZGfMTBWvc?feature=shared

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    3. Uma figura, decerto; gosto da sua atitude insubmissa. A poesia dela, em geral, não me comove; há uma inclinação para a grandiloquência que me desagrada.

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    4. É uma persona. Quem anda no circo assume posturas postiças que nada querem dizer. Acho que merecemos isso.

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