18 de outubro de 2023

POESIA EM LÍNGUA PORTUGUESA, século XX (11)

 

A PORTA APORTA

 

a porta roda ao invés da lua

a porta roda bússola enterrada ao invés dos olhos

a porta geme é um cão nocturno

a porta geme extinta na trela da noite

a porta areia

a porta caruncho pária de mar

a porta maré que vem e que vai que bate e que fecha

a porta com máscara de morte

a porta sem sorte

a porta joelho na alma das portas

a porta mulher da casa de passe

a porta manchou a manhã com o grito de porta

a porta enforcada no mastro da casa

a porta por asa

a porta roda

a porta sexo a vida toda

a porta tosca da madrugada pregos são estrelas mortas

a porta pregada

a porta leilão

a porta batente a porta aranha por coração

a porta tu

a porta eu

a porta ninguém na terra pequena

a porta roda

a porta geme

a porta facho

a porta leme

 

LUIZA NETO JORGE, Quarta Dimensão (1961)


7 comentários:

  1. É muito deficiente o meu conhecimento da sua poesia, infelizmente. Ainda não calhou...
    Quanto ao poema, já fui mais entusiasta dos malabarismos com palavras e conceitos, que têm obviamente o seu lugar. Para mim, quer na poesia, principalmente, mas também na prosa, sem trabalho sobre a palavra não há literatura.

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  2. Também não está aqui por acaso.
    «Entrai pela porta estreita, porque é larga a porta e espaçoso o caminho que leva à perdição, e são muitos os que entram por ela! Como é estreita a porta e apertado o caminho que leva à vida, e são poucos os que o encontram!» --- Mateus, 7:13-14.

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  3. É isso tudo. Muitos. Muitos. Desconcertante inteligência. O meu entusiasmo é exuberante. Palmas.

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  4. Ninguém está aqui por acaso. Basta traduzir o titulo do blogue em polaco e nota-se logo o másculo e ressabiado respeito pelo feminino.

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  5. A amante holandesa - essa é fanhosamente hilariante.

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