11 de maio de 2024

101 poemas portugueses - #38


TRÊS PERSONAGENS


Em pleno inverno e no calor de Agosto, 
vejo-os passar, na tarde loira ou baça...
Ela, tem distinção, tem certa graça,
certa elegância calma, de bom gosto.

Leva um livro amarelo. Bem disposto,
um galgo inglês, cheio de nervo e raça,
acompanha-a. Sei sempre a que horas passa,
grave, serena, esfíngica; -- ao Sol posto.

Quem é? Quem são?... Nem lhes conheço o nome!
O acaso, por acaso, destinou-me
a vê-los passar juntos, todos três...

Donde vêm? Onde vão? -- Quem o adivinha?
O que eu sei, é que passam à tardinha
ela, o livro amarelo, e o galgo inglês...

Virgínia Vitorino (Alcobaça, 1895 - Lisboa, 1967),
Renúncia (1926)

4 de maio de 2024

101 poemas portugueses - #37.


A NOITE DESCE

Como pálpebras roxas que tombassem
Sobre uns olhos castanhos, carinhosos,
A noite desce... Ah! doces mãos piedosas
Que os meus olhos tristíssimos fechassem!

Assim mãos de bondade me embalassem!
Assim me adormecessem, caridosas,
E em braçadas de lírios e mimosas,
No crepúsculo que desce me enterrassem!

A noite em sombra e fumo se desfaz...
Perfume de baunilha ou de lilás,
A noite põe-me embriagada, louca!

E a noite vai descendo, muda e calma...
Meu doce Amor, tu beijas a minh'alma
Beijando nesta hora a minha boca!



Florbela Espanca (Vila Viçosa, 1894 - Matosinhos, 1930)
Poesia da Noite, selecção e prefácio de Urbano Tavares Rodrigues


(lido numa sessão de 2011)

3 de maio de 2024

o início de ETERNIDADE

«Manhã alta, toda vestida de azul, com folhos brancos que o mar tecia e esfarrapava ao sabor da ondulação, a sombra escortinada na linha do horizonte ia crescendo e definindo-se em caprichoso recorte.» 

Ferreira de Castro, Eternidade (1933), 14.ª ed., Lisboa, Guimarães Editores, 1989, p. 21.

2 de maio de 2024

1º DE MAIO COM FERREIRA DE CASTRO

 

1 DE MAIO DE 1974: Ferreira de Castro participa na manifestação do 1º de Maio em Lisboa.
A pedido do cineasta Glauber Rocha, o romancista deixa uma mensagem:
“A mim ainda me parece inverosímil que, após quase 50 anos de opressão e de falta de liberdade, o povo português se tenha libertado dessa mesma opressão e que sinta hoje, sinta nos últimos dias, uma alegria que é verdadeiramente indescritível! E aproveito a ocasião para saudar, no Brasil, os brasileiros, os meus camaradas brasileiros, aos quais estou profundamente ligado pelo coração e pelo espírito!” [Fonte: CENTRO DE ESTUDOS FERREIRA DE CASTRO].

Pela nossa parte, fomos ontem em romagem à sepultura do Mestre na Serra de Sintra:



O ar estava frio, mas alegre. Os turistas abundavam, descendo e subindo as veredas da Serra. Foi bom.