CARTAS XXIX e XLV
Vou a meio do livro e sinto-me bastante enriquecido cultural e esteticamente com o que vou lendo (as próprias cartas e as suculentas e mui eruditas notas do autor). Renovo, por isso, o meu agradecimento e as felicitações ao Ricardo Alves.
O que em primeiro lugar ressalta destas cartas e creio que da generalidade da literatura epistolar é o revelarem a personalidade e os gostos (às vezes as fraquezas e achaques) de quem as escreve e, indirectamente, também do destinatário. São quase um espelho da própria alma. Curiosa, por exemplo, a confissão/lamento de um já septuagenário M. Teixeira-Gomes (Carta XXIV) quando diz que os empachos da idade só lhe permitem ler muito lentamente.
Muitas coisas me impressionaram até agora, mas vou apenas referir em particular duas:
Na carta XXIX (João da Silva Correia) achei imensa graça à passagem em que o autor diz a Castro que apesar da prova de algodão quanto ao êxito de uma obra (o fazer chorar a criada) duvidava que tal se verificasse sempre, porque uma peça de teatro que escreveu ao 19 anos e que não tinha pés nem cabeça fez chorar mais na sala de espectáculos do que um Sermão do Encontro (se alguém não souber o que é, posso esclarecer)
Na carta XLV, Herberto Sales, falando de A Lã e a Neve, diz:
"Ali há vida como só na vida... Não sei como se pode criar um mundo e criar gente de carne e osso, através da simples enfileiração de caracteres tipográficos... Sua força de persuasão é tão grande que a gente não se conforma que Horácio seja um mero tipo de romance. Não. É um moço português que vive e foi recenseado. Ele está aí. Não pode deixar de estar."
Que maior elogio pode receber um autor?