A ARANHA: ROMANCE OUVIDO NUM JARDIM,
POR ENTRE DENSA FOLHAGEM
Adoro as tuas pernas, meu amor,
as mais bonitas que entre folhas vi!
Se as pudesse afagar aqui, e aqui…
Oh, o prazer de as conhecer de cor!
Na sua cor de céu vazio de estrelas
como hão-de os pêlos delas ser
macios!
Destas pernas virão supremos fios
de teias como tule, lisas e belas.
Aranha minha, tesouro viscoso,
a minha dor é não poder tocar-te
no perigo de depois me achares
delicioso,
a mim, que desfaleço em êxtase e na
arte
de querer tecer-te linhas muito
ternas
carregadas de fina sedução
e insistindo contigo a minha sorte:
poder ter-te encostada no meu peito
dizer-te tanta perna para tão curto feito!
Por uma perna tua eu suportava a
morte –
toma os meus palpos, patas, linfa,
coração.
ANA LUÍSA AMARAL (1956-2022), Mundo (2021)
Um poema do século 21 que não enjeita a rima.
ResponderEliminardir-se-ia uma atracção potencialmente fatal do sujeito poético...
ResponderEliminarNão sei porquê, mas caiu-me bem.
ResponderEliminarGostei deste livro mas mais dos poemas ecfrásticos de "Ágora" 🙂 Da forma como, recorrendo a reproduções de episódios bíblicos, readaptou alguns para a actualidade, questionando figuras como Salomé, Jesus Cristo, Maria, Lázaro, Adão e Eva.
ResponderEliminarA primeira poesia que leio sobre pernas. E que belas pernas, mesmo peludas...
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