27 de dezembro de 2023

25 poemas passados para português #7.


CORRESPONDÊNCIAS

 

A Natureza é um templo onde vivos pilares

Pronunciam por vezes palavras ambíguas;

O homem passa por ela entre bosques de símbolos

Que o vão observando em íntimos olhares.

 

Em prolongados ecos, confusos, ao longe,

Numa só tenebrosa e profunda unidade,

Tão vasta como a noite e como a claridade,

Correspondem-se as cores, os aromas e os sons. 

 

Há perfumes tão frescos como a jovem carne,

Doces como oboés e verdes como prados,

-- E há outros triunfantes, ricos, corrompidos,


Que se expandem no ar como coisas sem fim,

Como o âmbar, o almíscar, o incenso, o benjoim,

E cantam os arroubos da alma e dos sentidos.


Charles Baudelaire (Paris, 1825-1867),

Les Fleurs du Mal (1857)

versão de Fernando Pinto do Amaral (Lisboa, 1960)


CORRESPONDENCES


 La Nature est un temple où de vivants piliers

Laissent parfois sortir de confuses paroles;

L'homme y passe à travers  des forêts de symboles

Qui l'observent avec des regards familiers.

 

Comme de longs échos qui de loin se confondent

Dans une ténébreuse et profonde unité,

Vaste comme la nuit et comme la clarté,

Les parfums, les couleurs et les sons se répondent.

 

Il est des parfums frais comme des chairs d'enfants,

Doux comme les hautbois, verts comme les prairies

-- Et d'autres, corrompus, riches et triomphants,

 

Ayant l'expansion des choses infinies,

Comme l'ambre, le musc, le benjoin et l'encens

Qui chantent les transports de l'esprit et des sens.

13 comentários:

  1. Fez-me sentir no Covão do Jorge, um recanto (ainda) paradisíaco, na zona das Penhas Douradas, Serra da Estrela.

    ResponderEliminar
  2. Ah caramba, Baudelaire ❤️
    Também li esta tradução do FPA. Sinto curiosidade pelas versões de Llansol e do João Moita.

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Não as conheço; esta edição tem toda a vantagem de ser bilingue.

      Eliminar
    2. Conheço a tradução do FPA e já tive nas mãos (não por muito tempo), a da Llansol. É uma tradução arrojada. Lembro-me do poema "Les Phares" (Rubens, Léonard de Vinci, Rembrandt, Michel.Ange, Puget, Watteau, Goya, Weber): FPA traduz, se não me engano, "Os faróis"; a Llansol, "Luminárias", e altera toda a disposição estrófica constituída em Baudelaire por 11 quartetos.

      Eliminar
    3. Isso será mais uma versão Llansol do que uma tradução, ou não? "As Florse do Mal de Baudelaire", por MGL

      Eliminar
    4. A versão Llansol tem provocado alguma controvérsia, pois.
      Sobre ela já li: «A tradução de Maria Gabriela Llansol não é para fracos entendedores de francês. Pelo contrário, para quem domine a língua é um duplo prazer: a tradutora eleva muitas vezes a tradução a um nível superior, equiparando-o (sem comparar) aos versos originais. Da introdução da tradutora, aos versos de Llansol, aos versos de Baudelaire, passando pelos vários prefácios que ele mesmo escreveu ao texto, e terminando com o posfácio de Valéry não creio que haja uma edição tão completa no mercado e tão cuidada.»
      Mas também: «Embora reconheça que o meu francês seja muito básico, principalmente, para me debruçar na poesia de Baudelaire no original, não é assim tão básico que não tenha conseguido aperceber-me do atentado aqui provocado.
      Observa-se um desrespeito total pela forma poética e pela pontuação e um uso banalizado de estrangeirismos ou do latim (não existentes no original), alterando muitas vezes o sentido do texto.
      Um trabalho de apropriação de uma das mais importantes obras da literatura. Na verdade, esta edição e tradução, aqui identificada arrogantemente como “versão”, defrauda os leitores, clientes e, acima de tudo, a obra.»

      Em 2024 conto ler "As Flores do Mal" na versão Llansoliana (não considero "versão", arrogância) e comparar com a de FPA. Estas controvérsias deixam-me ainda mais curiosa 🙂

      Deixo aqui uma outra versão deste mesmo poema.
      É da Margarida Vale De Gato. Retirei de uma antologia que comecei recentemente a ler, "O Outono de Oitocentos", página 129.

      "CORRESPONDÊNCIAS

      A natureza é templo de vivos pilares
      Que palavras confusas às vezes soletra,
      E o homem vai entre os símbolos da floresta
      Que o vigiam com olhos familiares.

      Como distantes ecos que ao longe se fundem
      Numa tenebrosa e profunda unidade,
      Imensa como a noite e como a claridade,
      Odores, cores, sons, que entre si respondem.

      Há cheiros frescos como a carne da infância,
      Doces como oboés, verdes como planuras,
      E outros vis, impantes, cheios de jactância,

      Extensos como coisas que não têm fim,
      Como incenso, âmbar, almíscar, benjoim,
      Que da alma e dos sentidos cantam as alturas."

      Gosto mais da versão de FAP!

      Eliminar
    5. Obrigado, Paula, também gosto desta, talvez até mais. O mínimo que se exige a um tradutor de poesia é que seja poeta, e mesmo assim...
      Da Llansol. já tinha pouca vontade e agora nenhuma. Acho que "versão" é um sinal de humildade; o que me parece arrogante é fazer o que se quer com um texto ou uma obra e dá-lo como do autor. Pelo que li acima, a capa teria de ostentar algo como "As Flores do Mal de Baudelaire lidas/vertidas/whatever por MGL". Como vem, isso é que me parece arrogância disfarçada de humildade, a pior das arrogâncias...

      Eliminar
    6. Pois ... Tenho de requisitar a versão Llansoliana das "Flores do Mal".
      Confesso ser leitora assídua de Llansol. Das escritoras que mais me fascina e encanta, sobretudo a escrita diarística, diária. Todo aquele mundo muito próprio com as beguinas medievais, os místicos, Camões, Fernando Pessoa, Bach, ...
      Quando passo pelo Grande Maior, na Volta do Duche, lembro-me sempre dela. Tinha ideia de ser reservada, pouco dada à feira das vaidades literárias até que recentemente, em Novembro, ao ler "Todos os dias uma carta - Correspondência Literária, 1967-2005" senti alguma arrogância, vaidade. Em cartas trocadas com Eduardo Prado Coelho referiu várias vezes uma possível candidatura ao Prémio Pessoa. Deixou-me confusa. Bom, de qualquer forma, creio serem poucos os escritores, poetas, artistas que não tenham um quê de arrogância ou até megalomania 🙂

      Eliminar
    7. O melhor é lê-los, sem os conhecer.

      Eliminar
  3. Conheço a tradução FPA, da A&A. Exacto na secção VI do Spleen et Idéal está traduzido por Os Faróis..."rubens,rio do olvido, jardim da preguiça,".

    ResponderEliminar