De todas as vidas se pode escrever um livro, é verdade, mais que não seja para narrar ao pormenor a sua infindável rotina quotidiana. Mas nem de todas se pode fazer uma nota marcante, breve e verdadeira. Quem tiver dúvidas que retire dos escaparates meia dúzia de calhamaços, com mais de quatrocentas páginas, e pratique esse exercício na parte de dentro de uma carteira de fósforos, relendo depois o que lá conseguiu meter. Se encontrou matéria suficiente para precisar da tal folha de papel de máquina, essa vida já valeu a pena.
A Morte do Rei de Espanha, Lisboa, Chiado Editora, 2012, p. 203.