28 de agosto de 2011

A NOITE DESCE, Florbela Espanca

Como pálpebras roxas que tombassem
Sobre uns olhos castanhos, carinhosos,
A noite desce... Ah! doces mãos piedosas
Que os meus olhos tristíssimos fechassem!

Assim mãos de bondade me embalassem!
Assim me adormecessem, caridosas,
E em braçadas de lírios e mimosas,
No crepúsculo que desce me enterrassem!

A noite em sombra e fumo se desfaz...
Perfume de baunilha ou de lilás,
A noite põe-me embriagada, louca!

E a noite vai descendo, muda e calma...
Meu doce Amor, tu beijas a minh'alma
Beijando nesta hora a minha boca!



Poesia da Noite, selecção e prefácio de Urbano Tavares Rodrigues, Lisboa, Neo-Farmacêutica, 1970, p. 49


(lido numa sessão de 2011)

4 comentários:

  1. No passado dia 24, estive num encontro em que foram lidos vários poemas de Florbela Espanca.Nesse mesmo dia postei um deles, 'Ser Poeta'. Poema lindo, tal como este!

    Olinda

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  2. O único poema que sei de cor e que interiorizei na adolescência. E o engraçado é que continuo a gostar :).

    Sonho Vago

    Um sonho alado que nasceu um instante,
    Erguido ao alto em horas de demência…
    Gotas de água que tombam em cadência
    Na minh’alma tristíssima, distante…

    Onde está ele, o Desejado? O Infante?
    O que há-de vir e amar-me em doida ardência?
    O das horas de mágoa e penitência?
    O Príncipe Encantado? O Eleito? O Amante?

    E neste sonho eu já nem sei quem sou…
    O brando marulhar dum longo beijo
    Que não chegou a dar-se e que passou…

    Um fogo-fátuo rútilo, talvez…
    E eu ando a procurar-te e já te vejo!
    E tu já me encontraste e não me vês!…

    in Charneca em Flor, Poemas

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  3. Um encanto, Ana Sara.

    Gostava de saber poemas de cor, mas nunca me exercitei. Sei dois ou três compostos apenas po um único verso, ou dois.

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