27 de outubro de 2024

101 poemas portugueses - #52


TRISTÍSSIMA CANÇÃO


Nesta saudade em que vivo
Há um mistério que eu estranho:
É pesar-me o bem que tive
Mais do que os males que tenho.
 
E ainda é maior a amargura,
Lembrando que o bem passado
Foi menos do que mesquinho,
pois foi apenas sonhado!
 
Nasceu dos meus pensamentos
Altivos e namorados,
E fez, morrendo, a harmonia
Dos meus versos magoados...
 
E mesmo assim, que saudade
Eu tenho, de encanto estranho,
Que lembra o bem que eu não tive,
E é o maior mal dos que eu tenho!...


Guilherme de Faria (Guimarães, 1907 - Boca do Inferno, Cascais, 1929),
Desencanto (1929)

 

3 comentários:

  1. Bom. Lá vem o catálogo...é saudosismo? Não sei...a saudade provém da nostalgia daquilo que já tivemos, embora as ideias, o imaterial são objectos...mas posso ler aqui uma volta camoniana, clássica, enraizado até no pensar português...acha que estou a pensar bem?

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Caro, está certamente. Não vejo é aqui saudades do futuro. Aliás, ele cortou com o pascoais, mas não sei se foi por causa disso.
      Abraço

      Eliminar
  2. Eu tenho saudade do que não tive. Do que tive, não tenho.

    ResponderEliminar