2 de novembro de 2023

POESIA EM LÍNGUA PORTGUESA, século XX (26)

 

TENDO LIDO UMA CARTA ACERCA DE UM SEU LIVRO DE POEMAS, QUE OFERECERA

 

Por que entristeço ao ler o que de meus

versos escrevem, se não é de mim

que escrevem?

Será que chora em mim o que meus versos foram

antes de ser meus?

Por que pergunto, se já sei por quê?

 

Escuto longamente, leio, espero,

e o poema é voz de toda a gente, todos eles, que,

não se tendo ouvido, não a sabem sua.

E vêm chorar em mim o coração traído,

a música perdida em distracções urgentes,

umas palavras que ninguém falou.

 

Não entristeço, pois. Apenas sou pergunta,

e, sendo eu, me esqueço ao perguntar.

 

                                                                                   5/1/1951

 

JORGE DE SENA, Post-Scriptum (edição póstuma)



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